AUP 272:
Organização urbana e planejamento

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Criado:
2000.11.30
Atualizado:
2000.12.17
CD, JS

AUP 272: Organização urbana e planejamento    FAUUSP/ Departamento de projeto 
Ano letivo 2000                                                                 Grupo de Disciplinas de Planejamento 
.Csaba Deák | Maria Lucia Martins | Helena M B Silva | João Whitaker
.Volta

FAUUSP OUTUBRO 2000 - MONOGRAFIA AUP272 ORGANIZAÇÃO URBANA & PLANEJAMENTO
ESTRUTURA SOCIAL E MOBILIDADE

Eduardo Hiroshi Omine
 
 

Este trabalho procurará identificar alguns aspectos relacionados às questões da estrutura social e mobilidade na região metropolitana de São Paulo. Se propõe esta temática dentro do atual contexto de alta desigualdade social entre a periferia e o centro de São Paulo, já que uma política de transporte urbano de alcance metropolitano, além de dissolver as desigualdades espaciais intraurbanas, permitiria às populações mais periféricas um melhor acesso aos equipamento públicos existentes nas áreas centrais, o que por sua vez contribuiria para a redução das desigualdades sociais. É evidente que, para uma completa redução da desigualdade social, seria necessária também uma série de medidas políticas e econômicas de âmbito estadual e nacional.

Percebe-se claramente que a desigualdade social é altamente relacionada à desigualdade espacial dentro da aglomeração urbana de São Paulo. Fatos facilmente perceptíveis como a ausência na periferia de espaços públicos, praças, parques, refletem o abismo social. Por isso, a colocação em prática de um plano metropolitano de transportes urbanos, contribui direta e indiretamente para a redução dessa desigualdade. Diretamente porque elimina a diferenciação de preço do solo urbano, levando acessibilidade à região metropolitana como um todo. E indiretamente porque essa acessibilidade permite um maior usufruto da cidade pelas populações periféricas de renda mais baixa.

Desse modo, este trabalho fará inicialmente uma rápida abordagem a respeito da análise de dados da Pesquisa Origem Destino do Metrô de 1987 (vide Déak, "Elementos de uma política de transportes para São Paulo"). O indicador de mobilidade, como é chamado, indica quantas viagens diárias per capita são realizadas, e foi relacionado na pesquisa OD87 com o modo principal (coletivo, individual, outros) e as faixas de rendas da população. A partir deste indicador, e com base em alguns dados da pesquisa OD de 1997, se fará um pequeno comentário a respeito do PITU 2020 (Plano Integrado de Transportes Urbanos), produzido pela Secretaria de Transportes Metropolitanos, já que este plano usa o índice de mobilidade como importante indicador e parâmetro de seu desenvolvimento.
 
 

MOBILIDADE SEGUNDO A FAIXA DE RENDA

Para uma breve análise do índice de mobilidade segundo a faixa de renda na RMSP, foram considerados os dados das duas tabelas seguintes, com seus respectivos gráficos (índice de mobilidade e números absolutos de viagens e de população por faixa de renda).

O indicador final mostra o número de viagens per capita (mobilidade) por faixa de renda, considerando todos os modos de locomoção. Na faixa superior de renda, a média é de 2,64 viagens per capita, enquanto na faixa inferior é de 1,26. Os indivíduos da classe mais alta realizam, em média, o dobro do número de viagens dos indivíduos da classe mais baixa. Decompondo este indicador segundo os diferentes modos de locomoção, percebe-se que a desigualdade de mobilidade é ainda maior. Um dos indicadores mostra que 79,16% das viagens por transporte coletivo são realizados por indivíduos que pertencem a famílias de renda entre 4 e 15 salários mínimos. No entanto, o indicador que mostra a maior desigualdade é justamente o do transporte individual (automóvel, táxi, lotação e moto). Enquanto a faixa superior de renda apresenta média de 1,74 viagens per capita, esse índice cai para 0,10 na faixa inferior de renda. Ou seja, através de transporte individual, a classe mais alta faz 17 viagens enquanto a classe mais baixa faz 1 viagem. Ressaltamos ainda que a classe mais alta, neste caso, consiste em apenas 8% da população total da região metropolitana, enquanto a classe mais baixa corresponde a 21%. Com estas observações, fica claro que além da alta concentração de renda, existe também uma alta "concentração de mobilidade".

O privilégio dado ao sistema viário na cidade de São Paulo foi, com certeza, um dos mais fortes fatores que determinaram esta desigual distribuição da mobilidade. O transporte individual, principalmente por automóvel, foi grandemente favorecido com os grandes viadutos e complexos viários da cidade. A taxa de motorização vem crescendo na RMSP, em princípio devido às vantagens oferecidas pelo carro em relação a conforto e liberdade, e também por causa da valorização do sistema viário pelos investimentos públicos. No entanto, hoje o transporte individual já não apresenta todas as vantagens inicialmente propostas, principalmente em relação ao tempo de viagem. O excesso de automóveis tem como consequências os grandes congestionamentos, ou seja, perda de tempo nos deslocamentos. A pesquisa OD97 mostra que houve uma pequena diminuição do índice de mobilidade em todas as faixas de renda, apesar do crescimento da taxa de motorização, refletindo assim a atual ineficiência dos transportes urbanos.
 
 

MOBILIDADE (VIAGENS PER CAPITA) SEGUNDO MODO PRINCIPAL E FAIXA DE RENDA (SM) 
 
modo principal
faixas de renda (sm)
<4
4-8
8-15
15-30
>30
TOTAL
coletivo
0,47
0,64
0,76
0,72
0,51
0,63
individual
0,10
0,20
0,47
0,90
1,74
0,50
motor (col+ind)
0,57
0,84
1,22
1,62
2,25
1,14
a pé / outros
0,69
0,77
0,70
0,58
0,39
0,67
índice de mobilidade
1,26
1,61
1,93
2,20
2,64
1,80

 

PRODUÇÃO DE VIAGENS SEGUNDO MODO PRINCIPAL E FAIXA DE RENDA (SM) 
 
faixas de renda (sm)
<4
4-8
8-15
15-30
>30
TOTAL
viagens motor (x1000)
1921
3834
5189
4567
2903
18525
viagens (x1000)
4262
7377
8181
6185
3402
29407
população (x1000)
3378
4577
4247
2812
1290
16304
população (%)
20,70
28,10
26,00
17,2
7,9
100,00

fonte: pesquisa Origem Destino Metrô SP 87
 
 


 
 


 
 

DISTRIBUIÇÃO DE RENDA NA GRANDE SÃO PAULO

A análise dos dados precedentes mostrou que o índice de mobilidade é menor para os indivíduos de menor renda familiar. O conhecimento da distribuição espacial da renda permite então verificarmos de forma aproximada quais as regiões da área metropolitana que possuem os menores e maiores índices de mobilidade. Tendo isso em vista, é possível visualizar quais as regiões mais carentes de investimentos em transportes, aquelas regiões social e espacialmente mais segregadas.

Para essa visualização, foi tomado como referência principal o mapa de distribuição espacial da renda (abaixo) da pesquisa OD97. Em resumo, observa-se nesse esquema que as populações de baixa renda ocupam toda a periferia. Quanto maior a distância ao centro, menor é a faixa de renda (em geral). As populações de renda mais alta ocupam as regiões central e sudoeste da região metropolitana. Com isso, constata-se a generalização da pobreza nas populações periféricas, o que tem como consequência uma falta de acessibilidade generalizada em toda a periferia.

E essas constatações se confirmam com a verificação do mapa de densidade de viagens (em 1997) na região metropolitana de São Paulo (vide PITU 2020). A desigualdade do índice de densidade de viagens (viagens/hectare) é clara : a região central/sudoeste apresenta alta densidade (entre 180 a 856 viagens/ha), enquanto as periferias apresentam densidade bem mais baixas (menor que 120 viagens/ha). Tendo também em vista que as periferias apresentam densidade populacional mais alta (vide PITU 2020), mais uma vez se constata a grande desigualdade de acessibilidade (segregação social e espacial) na região metropolitana, tendo como consequência a desigualdade de mobilidade.
 


 
 
 

PITU 2020

Em resumo, o PITU 2020 é um plano que objetiva a construção de uma rede básica de transportes públicos integrados (com dominância das linhas de metrô e metrô leve, em conjunto com corredores exclusivos de ônibus, linhas de VLP, e medidas de gestão como a construção de estacionamentos e cobrança de pedágio urbano) que possa servir como uma espinha dorsal para uma posterior expansão e adensamento. A rede básica proposta pelo PITU 2020 propõe novas linhas de metrô, de caráter perimetral, interligando os braços do atual sistema radial e conectando a periferia ao centro. Além disso, propõe a expansão das linhas já existentes, e a criação de uma linha de metrô leve conectando os aeroportos de Congonhas e Cumbica através de uma linha sudoeste-nordeste. Grandes equipamentos públicos, como o Parque do Ibirapuera, o Parque Villa-Lobos, a Cidade Universitária também deverão ter fácil acesso através dessa nova rede. O Centro Histórico de São Paulo passará a abrigar uma série de estações de baldeação entre as novas linhas, voltando a ser uma região da cidade de alta acessibilidade (e não mais no vetor sudoeste).

Sob o ponto de vista da questão da estrutura social da região metropolitana de São Paulo, e as relações existentes com a segregação espacial da metrópole, podemos analisar essa estrutura proposta pelo PITU 2020. Vimos inicialmente que a mobilidade é um índice fortemente relacionado à faixa de renda da população, e também que as populações de baixa renda estão distribuídas espacialmente na periferia da RMSP. Tendo em vista estes dados, podemos afirmar que o PITU 2020, sendo uma proposta integrada de transportes urbanos, é um importante projeto a ser realizado, pois desenha uma rede que ao mesmo tempo permite o acesso das periferias ao centro, e também a acessibilidade perimetral entre bairros de periferia. Como se coloca no PITU, sua execução traria como resultados a duplicação do índice de mobilidade da população de baixa renda, e a triplicação da facilidade de acesso da população de baixa renda aos bens e serviços urbanos. O principal fator que determina esses resultados é a integração entre os diversos meios de transporte urbano : metrô, VLP, ônibus, automóvel.

O PITU 2020 se autodefine como um plano estratégico, que tem como objetivo principal transformar a metrópole de São Paulo numa "metrópole competitiva, saudável, equilibrada, responsável e cidadã". Para tanto, coloca como objetivos da política de transportes o aumento da acessibilidade geral, da acessibilidade ao centro, da acessibilidade às regiões vizinhas, da acessibilidade dos grupos de baixa renda e da acessibilidade aos subcentros, tendo como principal indicador de desempenho o índice de mobilidade geral e de mobilidade das populações de baixa renda. Com isso, procura revalorizar o centro histórico da metrópole, e ao mesmo tempo levar acessibilidade às populações de baixa renda da periferia.
 
 

CONCLUSÃO

Sobre a questão da mobilidade em relação à estrutura de classes sociais da região metropolitana de São Paulo, é importante retomarmos alguns dados:

- os 8% mais ricos realizam em média 17 vezes o número de viagens por modo individual realizadas pelos 21% mais pobres;

- 79,16% das viagens por transporte coletivo são realizados por indivíduos que pertencem a famílias de renda entre 4 e 15 salários mínimos;

- as populações de baixa renda habitam a periferia da metrópole, onde há as maiores densidades demográficas e as menores densidades de emprego e de viagens;

Estes dados nos permite refletir sobre a importância de um plano básico metropolitano de transportes urbanos integrados, como o PITU 2020, sob os aspectos da homogeneização do preço de solo urbano e da acessibilidade na região metropolitana como um todo. Dada a forte relação existente entre a mobilidade de uma população e sua distribuição de renda, a execução de um PITU seria de extrema importância no sentido de diminuir a desigualdade de acessibilidade e do índice de mobilidade, o que por sua vez contribuiria para a redução das desigualdades sociais e espaciais da região metropolitana de São Paulo.
 
 

BIBLIOGRAFIA

DEÁK,Csaba (1990). "Elementos de uma política de transporte público para São Paulo". Espaço & Debates 30:42-55

PESQUISA ORIGEM/DESTINO METRÔ SP 1997 (www.seade.gov.br)

PITU 2020. Secretaria de Estado de Transportes Metropolitanos, junho 1999