.AUP 823
.Acervo
fau

Disciplina  AUP 823 Seminário de Integração, 2004, 2º sem.
Profs.       Csaba Deák, Nuno Fonseca
Aluno       Fabiane Pizzirani
Criada 05.1.26
O papel dos processos de participação popular
na gestão municipal:
Estudo do orçamento participativo no Município de Rio Claro

Fabiane Pizzirani

Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas * Departamento de Geografia
Orientadora: Profa Livre Docente Ana Fani Alessandri Carlos

Apresentação


O presente artigo se refere ao início de uma pesquisa que será produto para a elaboração de uma dissertação de mestrado em Geografia Humana. São apresentadas aqui algumas idéias que se pretende desenvolver durante a realização desta pesquisa; a descrição do processo de participação popular, em especial o Orçamento Participativo de Rio Claro; e também alguns questionamentos e contestações que deverão ser elucidados no futuro. 

 

< style="color: rgb(51, 51, 51);">Introdução

É a partir da chegada ao poder, de partidos progressistas em algumas prefeituras municipais brasileiras, que o chamado à população para participar mais ativamente das decisões das administrações municipais, começa a aumentar e se difundir por diversos municípios de nosso país.


No Município de Rio Claro, é a partir de 1997, com uma nova administração municipal chegando ao poder, que essas idéias passam a ganhar forma e a se tornarem ações efetivas dentro do Município. A vontade política de trabalhar conjuntamente com a população nas tomadas de decisões, referentes à diversas temáticas, é transparecida na formação e reestruturação, dos já existentes, conselhos municipais. Os conselhos municipais existentes e, os que futuramente foram criados, são de diferentes naturezas e agregam os mais variados segmentos da sociedade em torno de uma temática específica, que são de interesse social, econômico e cultural de toda a população.

Em Rio Claro existem atualmente, 21 conselhos municipais, que tratam de uma grande diversidade de temas, entre eles citamos: Conselho Agrícola Municipal, Conselho de Desenvolvimento Urbano, Conselho Municipal de Aposentados e Idosos, Conselho Municipal de Assistência Social, Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, Conselho Municipal de Educação, Conselho Municipal da Pessoa Portadora de Deficiência, Conselho Municipal de Saúde, Conselho do Orçamento Participativo, Conselho Municipal de Transportes Públicos, Conselho Municipal da Comunidade Negra, Conselho Municipal de Segurança, Conselho Municipal de Meio Ambiente, etc.

Os Conselhos Municipais são compostos por representantes eleitos pela sociedade e representantes do governo. Há uma institucionalização desses conselhos, através de ordenamento jurídico e um regimento interno que  normatiza o funcionamento destes. É válido lembrar que o regimento interno é discutido e elaborado pelos membros dos conselhos e nunca podem ferir a legislação vigente.

Dentre os conselhos municipais, o que ganha mais destaque e é o mais comumente conhecido, devido a grande proliferação deste tipo de conselho em inúmeros municípios brasileiros e, também por trazer uma maior partilha de poder, já que tem ligação direta com a distribuição de verbas municipais, encontramos o Orçamento Participativo.
< style="color: rgb(51, 51, 51);">


O Orçamento Participativo em Rio Claro


O Orçamento Participativo de Rio Claro começa a vigorar efetivamente em 1998. Em 1997, ano que o governo progressista assume o governo municipal, o que acontece é uma consulta junto à população, para que a nova administração tivesse maior contato com os problemas e necessidades que a população local enfrentava. A partir do ano seguinte, passa a vigorar o processo do Orçamento Participativo (OP), que difere-se também dos outros conselhos municipais, devido a complexidade de sua formação, que será explicitada a seguir.


No primeiro ano de  OP, a administração municipal optou por realizar reuniões em todos os bairros das cidades, aconteciam duas reuniões em cada um dos 120 bairros da cidade, onde seus moradores podiam opinar e indicar demandas para seus bairros e, posteriormente estabelecer as principais prioridades. Essa maneira de organização do processo mostrou-se inviável, pois na cidade existiam mais de 120 bairros e a equipe técnica era pequena, existia também grande dificuldade de sistematização das prioridades, já que a quantidade de demandas solicitadas era bastante numerosa, assim como a verba destinada para a realização de prioridades era insuficiente.

Já no segundo ano do OP, 1999, a equipe técnica decidiu por dividir a cidade em 16 regiões, para que houvesse uma melhor organização do processo e também para que existisse uma maior socialização dos conhecimentos e realidades entre os bairros. A divisão regional foi realizada baseada em critérios de semelhanças econômicas e sociais entre os bairros e também em proximidade entre eles, para que as regiões tivessem uma continuidade espacial, este fato trouxe uma generalização das características em algumas regiões, o que mostrou-se bastante positivo, posteriormente, devido ao trabalho realizado conjuntamente entre realidades bastante diversas encontradas no Município, trazendo para os moradores uma visão mais ampliada e mais realista sobre toda a comunidade.

A divisão regional atual do Orçamento Participativo está representada na ilustração  – Regiões do Orçamento Participativo.

 

< style="color: rgb(51, 51, 51);">

Regiões 1 a 11 e 17 – formada por bairros, todos incluídos no perímetro urbano do Município. Cada região contém aproximadamente 10 bairros.


Regiões 12 a 16 – distritos e bairros rurais pertencentes ao Município de Rio Claro. Cada região corresponde a 1 bairro rural ou distrito. Não existe um agrupamento devido a distância física entre eles.

Nota-se que na atual divisão, apresentam-se 17 regiões. A 17ª região, foi criada em 2002, após a reivindicação de 2 bairros pertencentes a região 7 e que espacialmente, estavam muito distantes dos demais bairros e do núcleo urbano, o que dificultava a participação dos moradores desses 2 bairros, que não possuem condições financeiras para se deslocarem até o lugar da reunião regional. Foram realizadas algumas outras alterações nas regiões, sempre solicitadas por moradores de bairros, que julgavam necessárias as alterações nas localizações de sua região para ampliar a participação da população.


Funcionamento do Orçamento Participativo


Organograma do Funcionamento do Processo do Orçamento Participativo – Rio Claro



O primeiro passo para organização do OP é montar o calendário de reuniões  para que se possa fazer a divulgação em todas as regiões do município. A divulgação das reuniões é fundamental para a difusão e o bom funcionamento do processo e, ela deve ser realizada através de diferentes mídias. Em Rio Claro, ela é feita através de outdoors espalhados pela cidade, propaganda em jornais de circulação local, emissoras de rádio e televisão local, aviso em diversos eventos que reúne pessoas da comunidade em geral e a distribuição de um folheto específico do OP, que contêm a divisão regional dos bairros, a data, local e horário das reuniões e uma breve explicação sobre o processo. Essa distribuição é realizada em todas as residências, alguns dias antes da reunião regional de cada bairro.


As reuniões regionais acontecem uma vez por ano e nelas os moradores dos bairros assistem a uma apresentação onde, é explicado como funciona o Orçamento Participativo e também informações sobre o funcionamento interno da prefeitura municipal. Após essa explicação, realizada por um técnico da Prefeitura, os moradores são divididos, de acordo com os bairros que pertencem, e discutem entre si quais são as demandas na área de obras e serviços de seu bairro e, também escolhem um representante e um suplente que irão representar o bairro na Plenária Geral.


As prioridades elegidas por todos os bairros são encaminhadas para os técnicos da Prefeitura, responsáveis por cada assunto levantado, para que eles possam analisar a viabilidade e possibilidade de realização dos pedidos. Essa etapa de análise, por parte dos técnicos, é necessária, porque muitas vezes os cidadãos fazem pedidos que são tecnicamente inviáveis como, por exemplo, construção de pronto-atendimento hospitalar, que funcione 24hs,  em um bairro onde ao lado já existe o serviço prestado, ou então obras que possuem valor muito alto e que a verba destinada ao OP não seria suficiente para realizá-la.


Após a realização dessa análise dos técnicos, é realizada a Plenária Geral, que acontece, geralmente, em uma noite de julho, onde todos os representantes de bairros, eleitos nas reuniões regionais, são chamados para conhecer a análise feita pelos técnicos e para juntos discutirem quais serão as 3 principais prioridades da região e eleger o Conselho do Orçamento Participativo. Eles realizam como uma “filtragem” das prioridades dos bairros, já que a verba não é suficiente para realização de todas as demandas. Nessa fase é bastante interessante a discussão entre os representantes dos bairros, porque eles conhecem mais profundamente as necessidades dos bairros e precisam decidir quais são as fundamentais para a região. Muitas vezes, o cidadão percebe que a prioridade de seu bairro vizinho é mais urgente ou mais importante e “abre mão” de sua demanda, para que outra possa ser atendida.


É na Plenária Geral também, que acontece a escolha do Conselho do Orçamento Participativo (COP). Os conselheiros do OP são escolhidos entre os representantes de bairros de cada uma das regiões, sendo que, cada região possui um conselheiro e um suplente. A partir dessa escolha, os representantes de bairro acompanham a evolução das ações do OP, entrando em contato com o conselheiro de sua região. Além dos 17 conselheiros regionais o COP também é formado por mais 4 conselheiros que são indicados pela administração municipal, referente a Secretaria de Obras, Secretaria de Justiça e Governo, Secretaria de Finanças e Secretaria de Desenvolvimento, Planejamento e Meio Ambiente, que é a Secretaria coordenadora do OP.


O trabalho realizado pelo COP é fundamental para o pleno desenvolvimento do OP, porque ele irá num primeiro momento discutir a distribuição da verba destinada ao processo, dentre as prioridades que foram elegidas em cada região. Essa é uma etapa bastante delicada, pois os conselheiros recebem um orçamento de cada uma das obras e serviços solicitados e terão que juntos decidirem qual será a distribuição da verba. O que ocorre, comumente, é que a verba destinada ao OP, acaba sendo suficiente para realizar apenas uma obra por região, o que muitas vezes pode frustrar os participantes. Por isso, é muito importante que os cidadãos não participem apenas como simples reivindicadores, eles têm de ter conhecimento sobre o funcionamento do orçamento municipal como um todo e, tudo que a realização de uma obra significa, por exemplo, manutenção constante e contratação de pessoal. Essas informações são apresentadas já nas reuniões regionais, quando se realiza uma comparação do orçamento municipal ao orçamento familiar, para que a população tenha maior proximidade com a temática. Porém, os conselheiros terão um maior aprofundamento dessas questões, à medida que irão estar em contato com o tema por mais tempo.


Após a discussão e distribuição da verba destinada ao OP, é preparado um documento onde são apresentadas as prioridades do OP e o orçamento para realização dessas e, esta documentação é entregue ao Departamento de Contabilidade da Prefeitura, para que eles agreguem ao orçamento geral do município. A chamada, peça orçamental da Prefeitura, deve ser entregue até o dia 30 de setembro para a Câmara de Vereadores e nesta entrega sempre estão presentes membros do COP, para que seja reforçada junto ao Poder Legislativo a contribuição dos cidadãos na formulação de parte do orçamento municipal.


Durante os meses de outubro a dezembro o COP tem uma interrupção de suas atividades, porque nesse período a Câmara Municipal de Vereadores vai estar estudando e analisando o orçamento, para realização de ementas quando forem necessárias. O Orçamento Municipal tem que ser aprovado até o dia 31 de dezembro e começa a vigor em 1º de janeiro. É a partir dessa data que o Conselho do Orçamento Participativo passa a exercer sua função de acompanhamento e fiscalização das prioridades que foram selecionadas para serem executadas. Esse acompanhamento é feito através de reuniões mensais, que reúnem os membros do Conselho e também representantes da administração municipal, que irão transmitir todas as informações sobre o andamento das prioridades e prestar contas do que está sendo realizado. Muitas vezes, durante a execução do orçamento vários problemas são enfrentados, problemas esses ligados a questões burocráticas e políticas. Todas essas questões devem ser passadas e bem discutidas com o Conselho para que os membros desse saibam quais são os obstáculos que têm que ser enfrentados para o pleno funcionamento da “máquina” administrativa e também para terem conhecimento dos limites que esse processo tem.
<> 



Prioridades


Com relação às solicitações que ocorrem durante as reuniões regionais, elas dizem respeito a questões ligadas a inúmeras temáticas. Podemos destacar as questões ligadas à educação, saúde, galerias e asfalto, convívio social e qualificação profissional. São geralmente, solicitações de construções e ampliações de escolas e postos de saúde; construção de centros comunitários; implantações de galerias e asfalto e realização de cursos profissionalizantes, solicitação essa que é fruto de discussões sobre desemprego e desqualificação profissional.


Abaixo, apresentamos um quadro que mostra as prioridades selecionadas pelo Conselho do Orçamento Participativo para o ano de 2004, e os valores destinados para realização destas.
<>
 

DESTINAÇÃO FINAL DA VERBA DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO 2004

Região

Obras

Valor destinado

1

Acostamento da rua dos Estudantes, de um só lado da pista, sem galerias, até a Rodovia.

R$ 300.000,00

2

Construção de galerias na avenida 64-A – São Miguel, para acabar com problema de enchentes na área atrás da escola Ephraim, Posto de Saúde Vila Cristina, Centro de Reabilitação. Com o compromisso da Prefeitura, juntamente com a comunidade, colocar o asfalto na avenida Joaquim Ribeiro ligando a rua 6-A e 7-A.

R$ 300.000,00

3

Quadra da EMEIF Victorino Machado (quadra coberta)

 

R$ 150.000,00

4

Ampliação da parte administrativa da EMEI Benjamin Ferreira, com a construção de um pátio coberto com iluminação para atividades.

R$ 120.000,00

5

Tubulação de águas pluviais (galeria meia cana) na rua Marginal da Fepasa, da av 29 até, se possível, com conexão da galeria da rua 6. Esta tubulação será aberta (não é galeria), margeando a linha férrea da Ferroban.

R$ 100.000,00

6

Escola no Jardim Novo I com espaço para realização das reuniões da Associação de Moradores (verba terá que ser complementada com verba da Secretaria de Educação)

R$ 160.000,00

7

Passagem da Castelo Branco e galerias do Jd Paulista I (terá que ser complementado com verba da Secr. de Obras)

R$ 200.000,00

8

Centro Comunitário junto ao conjunto poliesportivo (com sala para a associação de bairro e instalações para o programa PETI)

R$ 100.000,00

9

Construção de galerias, guias e sarjetas no Jd Progresso (para resolver, inicialmente, o problema principal da avenida 22)

R$ 100.000,00

10

Ampliação do Centro Dia do Idoso, com construção de mais salas, galpão e sanitários, beneficiando ainda mais a comunidade.

R$ 80.000,00

11

Aumento do efetivo e circulação de guardas municipais e PM nesta região. Verba para contratação de mais guardas municipais.

R$ 33.000,00

12

Construção da 1ª escola, creche.

 

R$ 200.000,00

13

Nova ambulância para atender o Distrito

R$ 60.000,00

14

Reforma do Centro Comunitário com retirada do campo de bocha e construção de um novo campo coberto fora do salão para, desta forma, aumentar o espaço no salão.

R$ 35.000,00

15

Apoio a regularização da terra (R$ 10.000,00) e intensificação de patrulhamento pela Guarda Municipal e solicitar para a PM maior segurança (R$ 33.000,00) Verba para contratação de mais guardas municipais.

R$ 43.000,00

16

Cascalhamento da via principal, aproximadamente 150 metros, pois já existe canalização das águas pluviais.

R$ 20.000,00

17

Galpão para reunião de moradores, atividades de saúde e área de lazer para jovens (capoeira e outros eventos) Lugar destinado dentro do terreno do posto de saúde.

R$ 60.000,00

TOTAL

 

R$ 2.061.000,00

< style="color: rgb(51, 51, 51);"> 

Um outro dado que observamos durante a realização das reuniões, nas diversas regiões do Município, é uma diferenciação de público e das discussões realizadas nesses encontros. Observamos que nas regiões periféricas as reuniões contam com um número elevado de pessoas, são sempre regiões que apresentam grande número de participantes. Nas reuniões das regiões mais periféricas e mais carentes economicamente, as solicitações referem-se a pedidos mais emergenciais. São solicitações para resoluções de problemas que eles vivem cotidianamente, problemas estes ligados ao mais amplo espectro de questões, sejam eles de educação, saúde, desemprego, infra-estrutura urbana, etc.


Já nas regiões centrais, a participação é bastante pequena, há sempre um número reduzido de pessoas que participam, já que essas pessoas têm um maior poder de consumo e buscam no mercado aquilo que necessitam. Por exemplo, saúde e educação, elas não precisam solicitar ao Estado, pois os encontram mais acessíveis e com melhor “qualidade” no mercado consumidor. Os problemas levantados de modo geral nas regiões centrais são ligados a questões de manutenção dos serviços já existentes, como limpeza de ruas, praças, segurança, etc. No entanto, há discussões que são realizadas, com essas poucas pessoas que comparecem ao chamado da Prefeitura, que são discussões mais aprofundadas e mais amplas e que dizem respeito à sociedade como um todo. Podemos citar como exemplo, discussões sobre exclusão social, exclusão digital, precarização do trabalho, desemprego, meio ambiente, etc. Problemas esses que não afetam os moradores dessas regiões diretamente, porém há uma preocupação com o desenvolvimento da sociedade.

De certa forma, esses temas são levantados em quase todas as regiões, porém nas regiões periféricas a população busca na Prefeitura uma base para solução imediata de seus problemas nessas áreas e nas regiões centrais as discussões buscam um aprofundamento nas temáticas para encontrar soluções à médio e longo prazo.
< style="color: rgb(51, 51, 51);">

Orçamento Municipal

Não podemos negar que o processo do OP traz uma interferência na destinação de recursos financeiros do Município. Ele trabalha com a fatia de 1, 27% do Orçamento Municipal, o que significa um pouco mais que R$ 2.000.000,00. Se formos analisar essa cifra, em relação, a fatia de investimentos, ela equivale à 7,47% do total dos investimentos feito pelo Município. Não é uma porcentagem muito alta, porém o uso dessa verba para investimentos em Rio Claro, já traz uma mudança na construção do espaço e na reprodução dos cidadãos.


Gastos Da Prefeitura Municipal de Rio Claro / 2004

 


Se analisarmos o gráfico acima, verificamos que grande parte do orçamento municipal já está comprometida com gastos que não podem ser alterados. O pagamento de salários dos funcionários, aposentados e pensionistas municipais, ocupa quase 50% dos gastos da Prefeitura. A manutenção dos prédios, obras e serviços oferecidos pelo Município ficam com 29% do recolhimento financeiro da Instituição. O Município também tem uma dívida herdada de administrações passadas que foi feito em dólar, o que também traz gastos bastante altos e instáveis, devido a variação cambial, para a Prefeitura.

Todas essas informações são passadas para a população que participa das reuniões regionais, para que elas tomem consciência dos compromissos que a administração possui. Para obtermos um maior entendimento, por parte da população, fazemos uma comparação com os gastos que as pessoas corriqueiramente têm em suas residências, gastos esses que não podem ser modificados ou não cumpridos. Isso faz com que os cidadãos tenham uma maior aproximação e compreendam de melhor maneira o funcionamento da Prefeitura.

Uma outra questão que também é bastante discutida nas reuniões regionais com os participantes é a necessidade de manutenção e contratação de pessoal para o funcionamento das demandas da população. Porque o que acontece, muitas vezes, é que os cidadãos não compreendem que para a construção de uma escola, por exemplo, não é necessária somente a construção do prédio, é necessário também que se contratem professores, merendeiras, diretores, auxiliares de serviços, etc. e também é fundamental a manutenção do prédio, como pagamento de energia elétrica, telefone, merenda e demais serviços necessários. Essa explanação faz com que os moradores dos bairros, aos poucos vão percebendo que não podem ter uma escola, creche e/ou posto de saúde em cada bairro de nossa cidade, o que de costume acontecia. No entanto, não são todas as pessoas que têm essa apreensão, e então é papel fundamental dos técnicos da Prefeitura explicarem para os moradores, quais são as possibilidades de implantações de determinadas obras em determinadas localidades.

Um outro fator que deve ser levado em consideração, quando analisamos o OP em Rio Claro, é que muitas vezes durante as negociações que são feitas no COP, entre população e administração municipal, há uma complementação de verbas quando o dinheiro destinado ao OP, não é suficiente para a realização plena de uma obra. Vamos ilustrar com um exemplo que aconteceu nas discussões do orçamento de 2004. Para a construção da escola, no bairro Jardim Novo I (região 6), seriam necessários R$ 300.000,00. Porém, se o COP disponibilizasse toda essa verba para esta determinada obra, outras prioridades, de outras regiões não poderiam ser realizadas. Então, os conselheiros discutiram, juntamente, com a Secretária Municipal de Educação, a possibilidade de esta Secretaria disponibilizar parte de sua verba para realização da obra. Foi assim que ficou decidido que o OP disponibilizaria R$ 160.000,00 para a construção da escola e a Secretaria Municipal de Educação disponibilizaria de seu orçamento próprio os R$ 140.000,00 faltantes. Essa verba não conta como sendo verba do OP, porém foi o COP que definiu a utilização de uma parte do orçamento da Secretaria de Educação, extra-oficialmente, porque essa não estava sendo apresentada como verba passível de discussão. Esse fato, que ocorreu em outros momentos do processo, em Rio Claro, ilustra que a verba discutida pelo Conselho do Orçamento Participativo, não são somente os R$ 2.000.000,00, destinados pelo governo municipal, muitas vezes esse valor é ultrapassado, embora esse “extra” não seja incluído como verba destinada ao processo.




Alguns questionamentos...


O processo do Orçamento Participativo é um avanço e um ganho para o crescimento da participação cidadã e para o desenvolvimento, aperfeiçoamento da democracia em nosso país, porque ela possibilita o debate. Sem dúvida, ele é uma manifestação e uma oposição ao período da ditadura militar, vivida na década de 70 e 80 em nosso país. No entanto, temos que ser bastante cuidadosos quando trabalhamos com esse processo e quando colocamos nele uma carga um tanto quanto pesada, transpondo para ele a idéia de um processo emancipatório e libertador. Temos que nos lembrar que essa ainda é uma participação comandada pelo Estado. É o Estado que produz, induz e organiza essa participação que tem como caráter principal a reivindicação. O OP nos apresenta uma participação reivindicatória e não autônoma e emancipatória. Se o Estado, no caso estudado a administração municipal de Rio Claro, não apresentar uma resposta positiva as reivindicações colocadas, ou seja, não realizar as obras e serviços solicitados, há um esvaziamento da participação, pois a população participa para verem suas reivindicações pontuais serem atendidas de maneira mais imediata.

O poder final de decisão sobre os encaminhamentos do orçamento ainda está nas mãos do Estado, porque é o poder Legislativo, mais pontualmente, a Câmara de Vereadores, quem aprova ou não o orçamento discutido e definido pelos membros da sociedade civil e será o poder Executivo quem irá aplicar o orçamento aprovado, ou seja, o poder dado aos cidadãos é pequeno e pouco definidor de políticas ou ações mais efetivas e concretas. A relação que se instala nesse instante é, no entanto dúbia, porque os vereadores costumeiramente aprovam, sem alterações, a fatia orçamentária elaborada pela população. E o prefeito, de maneira geral, realiza as prioridades elencadas, pois afinal é esta população quem os elege e permitem que eles ocupem cargos no poder municipal.

Porém, o Orçamento Participativo também revela aspectos positivos em nossa sociedade, que não devem e não podem deixar de ser ressaltados. A participação popular tem um grande potencial de desenvolvimento social e de transformação da sociedade, mas precisa ser descoberto e apropriado pelos cidadãos.

A questão da educação política e da mudança de cultura, em relação a política, é um dos grandes avanços que este processo nos traz. Com o OP e também com as diversas outras práticas democráticas implementadas nas administrações municipais (Conselhos Municipais Temáticos, Conferência da Cidade, entre outros), a prática democrática ultrapassa o dia das eleições para transformar-se no que podemos chamar de prática democrática cotidiana. O quadro atual da democracia representativa, em nosso país, confirma sua ineficiência e mostra que alguns cidadãos não mais estão satisfeitos com a situação posta e por isso, buscam atuar no seu lugar, para que a reprodução e realização da vida aconteçam com mais qualidade e dignidade. Mesmo que essa participação, em princípio, seja apenas reivindicatória ela traz uma maior aproximação da população ao funcionamento do Estado, a população conhece os limites e as possibilidades de atuação deste. Há também um desenvolvimento, que não é imediato, da mentalidade política e cidadã da sociedade. É observado no decorrer dos anos de realização do OP em Rio Claro, que muitos cidadãos têm uma nova visão e uma nova consciência do papel que ele pode exercer na sociedade. Presenciamos diversas vezes manifestações de cidadania e solidariedade, que são frutos do trabalho realizado, dessas pessoas, junto aos conselhos municipais e aos processos de participação popular.

Os processos de participação popular, de maneira geral, ainda têm que se desenvolver muito para que possam alcançar um maior poder de decisão, de realização, de mudanças na gestão e organização das cidades e de transformações da sociedade. Estes processos ainda ocorrem de maneira muito isolada entre eles, não existe uma conexão, um contato mais forte e estreito entre os diversos conselhos municipais, entre a Conferência da Cidade e o planejamento explicitado no Plano Diretor e no Plano Plurianual da administração municipal, falamos aqui da cidade de Rio Claro em especial, porque é nosso objeto de estudo. Esse contato, esse maior entrosamento poderá trazer mais força e até maior autônima para a participação popular e para o poder de decisão e transformação dos cidadãos.


Referências bibliográficas


CHAUÍ, Marilena  - Cultura política e política cultural. In. Estudos Avançados – USP, vol. 9 nº 23, jan./abril 1995.

GENRO, Tarso e SOUZA, Ubiratan de. - Orçamento Participativo – A experiência de Porto Alegre. São Paulo: Perseu Abramo, 3º edição, 1997.

PINTAUDI, Silvana – Participação Cidadã e Gestão Urbana. In. Revista Cidades. São Paulo, vol. 2 nº 2, julho 2004.

PIRES, Valdemir - Orçamento Participativo: O que é, para que serve, como se faz. São Paulo: Manole, 2001.


SANTOS, Milton - O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel, 1987

.Topo


.AUP 823