Observações
A difícil
idéia de nação
??
Brasil ou brasileiros
(aqueles com falhas -- cf acima) ?
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Olavo
Setúbal
Ele gostava de polêmicas.
Tinha espírito público, mas sua visão do Brasil
era muito mais cética e desencantada
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR
O LEITOR pode estranhar o tema de hoje. Mas Olavo Setubal foi o
único banqueiro com quem mantive contato ao longo dos anos. Por
exemplo, no Conselho da Fiesp, no tempo de Mario Amato, e no
Fórum da "Gazeta Mercantil", no início da década
de 90. Depois, quando eu ainda morava em São Paulo, ele me
chamava, volta e meia, para almoçar na sede do Itaú.
Não concordávamos em quase nada, devo dizer, mas isso
não o desanimava, e ele continuava me convidando.
O brasileiro, dizia Nelson Rodrigues, é
muito aberto ao monólogo.
Dr. Olavo não era tipicamente brasileiro nesse particular.
Gostava de polêmicas e de dialogar com seus opositores. Ele
não mudava um milímetro de opinião, é
verdade, mas não posso reclamar: eu também não.
Uma vez ele me disse: "Alguns aqui no banco
acham que você é comunista. São uns ignorantes.
Você é gaullista". Exatamente. Nas suas "Memórias
de Guerra", Charles de Gaulle escreveu que, durante toda a sua vida,
ele se fizera "uma certa idéia da França". Sempre
acreditei que nós, brasileiros, também devemos nos fazer
"uma certa idéia do Brasil". E pensar o Brasil como destinado a
ocupar uma posição de destaque no mundo -dos pontos de
vista político, econômico e cultural.
Parafraseando
De Gaulle, se nos acontece a
infelicidade de ver a
trajetória do país marcada pela mediocridade, devemos
considerar que
estamos diante de uma anomalia absurda, imputável às
falhas dos
brasileiros, e não ao Brasil.
Olavo Setubal não compartilhava, é
claro, desses impulsos
nacionalistas, talvez românticos. Tinha espírito
público, mas a sua visão do Brasil era muito mais
cética e desencantada. Costumava dizer, às vezes com
certa exasperação: "Vocês esquecem do essencial: a
questão do poder". E repetia, com o seu vozeirão: "O
poder é a questão central!". Passava então a
discorrer sobre a inutilidade de se contrapor aos Estados Unidos. "Eu
construí esse império" -e apontava com orgulho para os
prédios do Centro Empresarial Itaú-, "mas não me
iludo: perto dos grandes bancos americanos, o Itaú não
representa grande coisa".
Isso foi há algum tempo. Hoje é
diferente. Enquanto os bancos americanos atravessam gravíssima
crise, os nossos continuam sólidos e poderosos -até
demais, como já tive ocasião de dizer nesta coluna.
Estou morando há quase um ano e meio no
exterior. Com a distância, meu nacionalismo romântico se
acentuou. Não esqueço, leitor, das nossas mazelas: a
pobreza, o atraso educacional, a vergonhosa concentração
da renda.
Mas o Brasil tem qualidades incomuns. Uma delas:
no Brasil, os
adversários raramente se transformam em inimigos. As
diferenças de
opinião não costumam descambar para o ódio e a
agressão pessoal. Não
sei se na Argentina, por exemplo, um economista com as minhas
características preservaria, ao longo de anos, o diálogo
com um
empresário como Olavo Setubal.
"A fatal
desvantagem da psicologia espanhola", escreveu Fernando Pessoa, "parece
ser a sua tendência para a divisão. Isto vê-se muito
claramente na
América do Sul. Enquanto a parte portuguesa, enorme como
é no seu
território, se conservou una sob o nome de Brasil, a parte
espanhola
dividiu-se em várias repúblicas. (...) O separatismo
parece ser, por
qualquer razão desconhecida, uma maneira de ser espanhola. (...)
[Já] o
Português (usando a palavra num sentido suficientemente lato para
incluir os brasileiros) mantém a sua tendência
orgânica para a unidade
e a coesão".
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