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cd, 11.017.19![]() |
Folha de São Paulo,
2011/07/16
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Observações Uma luz sobre Jango Desde os tempos do Império... ![]() Goulart em Goiás, 1963 "Mas"? Os próprios ingredientes da social-democracia, então prevalescente na Europa -- e que aqui só poderia ´vingar´ com o abandono dos entraves ao desenvolvimento. 'Esquerdas'? . |
João Goulart, que há 50 anos chegava à Presidência, é resgatado do limbo da memória do país em biografia que faz análise distanciada de paixões políticas Fraco, medíocre, demagogo. Fujão, covarde, traidor. Direita e esquerda carimbaram vários
adjetivos
na imagem de
João Goulart, o presidente deposto pelo golpe
militar de 1964. Nesta entrevista, ele fala do livro e diz que populismo não é um conceito teórico, mas uma desqualificação política. "Populista é sempre o outro, aquele de quem você não gosta", afirma. Jorge Ferreira - Estudei Getulio Vargas e o trabalhismo, daí a curiosidade sobre João Goulart. Foram dez anos de trabalho. Creio que chegou o momento de retirar Jango do limbo da memória do país. Ele foi um personagem importante, mas as análises sobre ele não se distanciam das paixões políticas. Ora é definido como demagogo e incompetente, ora como vítima de um grande conluio de empresários brasileiros com o governo norte-americano. Quis conhecer o personagem para compreendê-lo, e não julgá-lo. O livro é um relato
biográfico,
enfocando sua vida
política e
privada. Evitei enfoques sensacionalistas. Talvez a maior
novidade seja
lembrar à sociedade brasileira que um dia Jango foi
líder
político de
expressão. Como diz o historiador inglês Eric
Hobsbawm, o
papel do
historiador é lembrar à sociedade o que
aconteceu no
passado. Foi o que
eu fiz. Quais foram as influências sobre Goulart? Goulart, assim como Brizola, era jovem quando Vargas instituiu a ditadura. Ele entrou para a política no período democrático. Em 1945 e 1946, a democracia liberal tinha grande prestígio. As esquerdas e o trabalhismo associaram os ideais democráticos com o nacionalismo, o desenvolvimentismo, as leis sociais e o estatismo. Nos anos 1950, o Estado interventor na economia e nas relações entre patrões e empregados era um sucesso na Europa. Os trabalhistas observavam a experiência inglesa com o programa de estatizações e também o sucesso da industrialização soviética, com o Estado interventor e planejador da economia. Também culpavam os Estados Unidos pela pobreza da América Latina. O golpe de 1964 não foi dado por empresários que usaram os militares. O golpe foi dado por militares com apoio empresarial. A Fiesp, em inícios de 1963, apoiou Goulart na efetivação do Plano Trienal. Ele teve apoio de setores conservadores, desde que estabilizasse a economia, controlasse a inflação e se distanciasse das esquerdas, sobretudo dos comunistas e dos grupos que apoiavam Brizola na Frente de Mobilização Popular. Os grandes empresários, os políticos conservadores e a imprensa se afastaram de Goulart e passaram a denunciar o "perigo comunista" no segundo semestre de 1963, quando a economia entrou em descontrole e Jango se aproximou das esquerdas. Com o comício de 13 de março de 1964, os golpistas crescem e se unificam. A revolta dos marinheiros foi a fagulha que faltava, desencadeando gravíssima crise militar. A crise do governo Goulart tem uma história. É preciso reconstituí-la, com documentos e provas, superando repetidos jargões. Sou crítico em relação
ao
conceito de populismo.
Populistas podem
ser considerados Vargas e Lacerda, Juscelino e Hugo
Chávez,
Goulart e
Collor, FHC e Lula. Qualquer personagem político pode ser
chamado de populista,
basta não gostar dele. Populista é sempre o
outro, o
adversário, aquele de quem você não
gosta. O governo Goulart foi o auge do projeto trabalhista, que começou com as políticas públicas dos anos 1930, em época de autoritarismo. Mas que se democratizou, se modernizou e se esquerdizou a partir da segunda metade dos anos 1950. Seus elementos fundamentais foram o nacionalismo, o estatismo, o desenvolvimentismo, a intervenção do Estado na economia e nas relações entre patrões e assalariados, a manutenção e a ampliação dos benefícios sociais aos trabalhadores, a reforma agrária e a liderança política partidária de grande expressão. Creio que muitas dessas tradições inventadas pelos trabalhistas ainda estão presentes entre as esquerdas brasileiras.
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