2009.4.22
Verba para frigorífico
ameaça Amazônia
Estudo aponta que grandes grupos,
responsáveis por 40%
dos investimentos do BNDES em toda a indústria, avançam
na região
Ministério do
Meio Ambiente diz negociar que socorro a
empresas seja condicionado à aquisição de bovinos
de origem legal
MARTA SALOMON
DA
SUCURSAL DE BRASÍLIA
Beneficiários de quase metade dos
investimentos do BNDES (Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) na
indústria no ano passado (R$ 5,9 bilhões) e de um pacote
igualmente bilionário de socorro anunciado na última
quinta-feira, os frigoríficos estimulam o avanço da
fronteira agrícola na Amazônia.
A atuação dos frigoríficos
foi mapeada em estudo
da ONG Amigos da Terra. No trabalho, os frigoríficos aparecem ao
mesmo tempo como "causa e consequência" do crescimento da
pecuária na Amazônia Legal, atividade que mais devasta a
floresta. A região já é responsável por 40%
do rebanho bovino do país e banca parte das
exportações brasileiras de carne.
Consultado sobre as conclusões do
relatório, o ministro
Carlos Minc (Meio Ambiente) afirmou que negocia com a equipe
econômica condicionar o socorro financeiro aos
frigoríficos a restrições ao gado de origem
ilegal, mas empresários do setor negam que seja possível
cumprir esse tipo de exigência.
"Vou combinar com o Guido Mantega [ministro da
Fazenda] os detalhes nos
próximos dias", disse Minc. "Não dá para ter
condicionante", disse Roberto Giannetti da Fonseca, presidente da
Abiec, associação que representa os grandes
frigoríficos: "Acabar com o abate de gado de origem ilegal [na
Amazônia] é um objetivo desejável, mas é
impraticável".
Quatro grandes frigoríficos nacionais
-Bertin, JBS Friboi,
Marfrig e
Independência- lideram a lista das operações
diretas do BNDES com a
indústria em 2008. Juntos, receberam investimentos de R$ 4,7
bilhões.
Com as demais empresas do setor, os investimentos alcançaram, no
ano
passado, R$ 5,9 bilhões -40% do total contratado pela
indústria.
Esse valor não leva em conta
operações indiretas
do BNDES -via outros agentes financeiros, empréstimos de fluxos
de caixa e refinanciamentos de dívidas-, cujos desembolsos
à indústria somaram R$ 39 bilhões, segundo
informação do banco.
Concentração
Intitulado "A Hora da Conta: Pecuária,
Amazônia e
Conjuntura", o relatório da Amigos da Terra constata que os
grandes grupos frigoríficos, que não atuavam na
Amazônia até poucos anos atrás, já
detêm 60% das 73 unidades industriais com registro no SIF
(Serviço de Inspeção Federal) da região.
Um percentual ainda maior de grandes
frigoríficos foi
identificado
entre as indústrias instaladas nos 43 municípios
líderes do ranking dos
maiores desmatadores da Amazônia. "Pode-se constatar que, dos 16
frigoríficos instalados nesses municípios, todos com SIF,
10 pertencem
aos grandes grupos", diz o relatório. Está fora dessa
conta a unidade
do grupo Bertin em Tucumã, no Pará, por exemplo, que
recebe carne do
município de São Félix do Xingu, líder do
desmatamento.
A chegada dos grandes frigoríficos
à Amazônia
acompanhou o aumento das exportações brasileiras de carne.
Na Amazônia, uma região equivalente
a duas vezes e meia o
Estado de São Paulo é de pastagens. Uma parcela pequena
-menos de 6% das linhas de crédito destinadas à
pecuária- destina-se à recuperação das
pastagens, daí a grande extensão de pastos degradados.
A produtividade da pecuária é outro
problema na
região, onde a média é de pouco mais de uma
cabeça por hectare, extensão equivalente a 10 mil metros
quadrados ou pouco mais do que a área de um campo de futebol.
É menos da metade da média considerada ideal.
O rebanho nos Estados da Amazônia Legal, de
70 milhões de
cabeças, cresceu, nos últimos dez anos, quase três
vezes acima da média nacional. Essa expansão foi
estimulada pelo baixo preço da terra. Um hectare para pastagem
em Barretos (SP) é quatro vezes mais caro do que no sul do
Pará.
O preço baixo que atraiu os pecuaristas
é resultado da
falta de regularização das terras na região, onde
apenas 4% das propriedades privadas têm cadastro, segundo o
Incra. Sem títulos de terras, pecuaristas tampouco
dispõem de atestado de regularidade ambiental. Apesar de burlar
a legislação, a pecuária na Amazônia
é bancada majoritariamente por crédito de
instituições públicas: 81%, estima o
relatório.
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