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* Espaço & Debates 30:42-55

Apresentação provisória em html- CD, 2002.7.22
Versão abreviada em painéis 
Elementos de uma política de transportes para São Paulo*
Csaba Deák
 
1 Transporte e segregação espacial
2 Evolução do padrão das viagens e divisão modal
3 Mobilidade individual e a renda familiar
4 Parâmetros da demanda de viagens, 2000
5 Uma política de transporte rápido de massa: Metrô
 Apresentação

A pulverização das competências sobre os transportes, e em particular o transporte público na Região Metropolitana de São Paulo, entre o Município (ônibus) e o Estado (Metrô/trem) torna ainda mais importante a discussão pública e definição clara de uma política para esse elemento estratégico de infraestrutura urbana. Este capítulo procura reunir os elementos para a definição de uma tal política. Inicia com um breve histórico das políticas de transporte em São Paulo, e passa por uma análise sumária da mobilidade urbana e sua divisão pelos modos de transporte, em correlação com a renda da população, como reveladas pela Pesquisa Origem/Destino de 1987. Prossegue com estimativas de população, renda e distribuição de renda para dimensionar a demanda por transportes num horizonte de 10 anos. Chega a um esboço das definições de uma política de transportes com ênfase no transporte rápido de massa: o Metrô, poderoso elemento estruturador da configuração espacial. Conclui com uma avaliação da ordem de grandeza dos custos e benefícios do investimento envolvido, da ordem de US$ 10 bilhões, na construção de 125km de novas linhas de Metrô em 10 anos.

Comentários em 1997, 2002...

O texto foi originalmente elaborado em 1987 e revisado em 1990, motivado pela convicção de que o ritmo histórico de construção do Metrô (2 km/ano) assim como o ritmo corrente (4 km/ano nos últimos anos até 1990) eram incompatíveis com os níveis de demanda da Região Metropolitana de São Paulo ou com o estágio de desenvolvimento potencialmente alcançável pelo país. Seria provàvelmente presunçoso da parte de seu autor imaginar que o trabalho foi contraproducente, no entanto o fato é que em vez de acelerar as obras do Metrô, o governo estadual as parou de vez (e o município continuou ausente), de maneira que desafortunadamente o que foi escrito em 1990 continua perfeitamente atual: é só mudar a data-base de 1990 para 1997 e atualizar mentalmente os valores citados considerando uns 20-25% de inflação do dólar. Quanto aos efeitos da não-ampliação da rede de Metrô podem ser avaliados pelos 120-150 km de congestionamento diàriamente relatados em todos os jornais, em dias sem chuva ou inundação -- e apesar da recessão provocada pela política econômica praticada desde 1994.
 

1 Transporte e segregação espacial

Há cerca de vinte anos, pela virada da década de setenta, São Paulo estava no processo de passar de uma grande cidade a uma aglomeração urbana de primeira grandeza, cuja população de 7 milhões já ultrapassava aquelas de Paris e logo de Londres, e que continuava crescendo a taxas acima de 5% ao ano. Passava também por uma 'crise de crescimento': suas estruturas físicas tinham sua capacidade esgotada e estavam à beira do colapso.

O sistema de vias e de transportes em particular, instalado na década anterior e baseado no bonde, o ônibus, e uma incipiente mas rapidamente crescente motorização individual sobre as 'avenidas' do plano de Prestes Maia --era a época da desova das primeiras levas de produção da indústria automobilística recém-instalada--, havia se tornado inteiramente obsoleto. Não se tratava da necessidade de mera melhoria do sistema existente, senão da criação de estruturas de características e principalmente de escala inteiramente novas.

As propostas de técnicas de transporte urbano sobre trilhos (--bonde/Metrô) por um lado, e sobre pneu (--ônibus/automóvel) por outro, já haviam se confrontado na década de 1930, tendo vencido o pneu com o Plano de Avenidas de Prestes Maia. Na intensa atividade de planejamento do final da década de 1960 as grandes alternativas de solução da acessibilidade e circulação se confrontavam novamente. O Plano Urbanístico Básico/PUB (1968) propunha uma rede de Metrô de 650 km de extensão, para, após a estrada de ferro, as rodovias, e as Avenidas, ser o novo elemento estruturador da acessibilidade metropolitana; o Projeto DERMU, por sua vez, preconizava uma malha quadrada, de 4 km de lado, de vias expressas totalizando em torno de 400 km de extensão.

Desta vez, porém, não houve vencedor nem vencido. Nenhuma das propostas alternativas chegou a eliminar a outra, senão que ambas foram reduzidas a tal ponto que, em conjunto, reproduziram e --após um período inicial de algum alívio e uma tímida reestruturação da aglomeração metropolitana-- até exacerbaram o nível de carência de infraestrutura viária e de transportes. Essencialmente, o que foi implantado em vinte anos, isto é, até hoje (1991), é um embrião de ambos os projetos. Do Metrô foi implantada uma "rede" (composta de duas linhas formando uma cruz) que totaliza 45 km de linhas, e o sistema de vias expressas ficou reduzido às Marginais do Tietê e do Pinheiros e às Avenidas 24 de Maio, Radial Leste e Bandeirantes.
 


 

Essa é uma história muito resumida da política que levou à situação atual, em que perdura o secionamento da aglomeração metropolitana, hoje com 18 milhões de habitantes, em compartimentos precàriamente conectados, dos quais a Zona Norte (3 milhões de habitantes) e a Zona Leste (6 milhões) são os exemplos mais contundentes, e onde essa última continua com sua estrutura em 'espinha de peixe' carregando a Radial Leste, com acesso à área central estrangulado e com precárias ligações Norte-Sul quer seja com Guarulhos, quer com Paulista/Iguatemi, Santo Amaro ou o ABC. As demais infraestruturas urbanas seguem essencialmente o mesmo padrão de aguda escassez, resultando em uma extrema diferenciação da área urbana, e que por sua vez induz a forte segregação espacial prevalescente mediante uma estrutura de preços das localizações ('preço do solo') igualmente diferenciada.

Houve uma mudança significativa no padrão de urbanização paulistano durante os anos 80: acabou o crescimento acelerado ao qual São Paulo se acostumou durante um século de 'explosão demográfica'. Caíram as taxas de crescimento de mais de 5% ao ano para menos de 3% - apenas superiores ao crescimento vegetativo -, a periferia ia preenchendo seus vazios e concentrando o grosso do crescimento, e iam se esgotando as áreas não-problemáticas de expansão urbana. De certa maneira, diminuiu a diferenciação da estrutura urbana, uniformizaram-se os níveis de escassez da infraestrutura e ganharam proeminência problemas que dizem respeito à aglomeração urbana como um todo, tais como, acessibilidade, áreas de expansão, poluição e depredação dos recursos naturais, especialmente, hídricos. Uma das áreas de deficiência global mais aguda é o de transporte e mais especìficamente, do transporte público.
 
 

2 Evolução do padrão das viagens e divisão modal

O efeito da política de transportes dos últimos vinte anos em São Paulo --aliado às políticas econômicas a nível nacional-- é refletido na evolução do padrão das viagens da Região Metropolitana, como revelado em alguns de seus detalhes pelas três pesquisas origem-destino (1967, 77 e 87) do mesmo período. Na primeira década houve um aumento generalizado de mobilidade individual de 1 para 1,5 viagens diárias, dobrou a taxa de motorização sob o efeito combinado da elevação e da concentração de renda do 'milagre econômico', triplicou o número de viagens por automóvel e em consequência, a participação do transporte individual elevou-se de 31,9% (1967) para 39,0% (1977) das viagens motorizadas. Já na segunda década, o movimento mais forte foi uma queda sensível da mobilidade individual para 1,1 viagens diárias, com um correspondente aumento da proporção das viagens realizadas a pé, de um quarto (1977) para mais de um terço (1987) de todas as viagens, sob o efeito da política recessiva adotada após o abandono do II PND e consequente queda de todos os níveis de salários (ver Tabela 1 abaixo). Houve ainda, mais uma redução da divisão modal contra os transportes coletivos, agora menor, e devido quase exclusivamente à queda da renda (a taxa de motorização cresceu meros 7% durante a década) que afeta mais a mobilidade das populações de renda baixa e média e que são os principais usuários do transporte coletivo.

Tabela 1

REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO
EVOLUÇÃO DA DIVISÃO MODAL: 1967, 1977 e 1987
(coletivo, individual e a pé)
 

1967
 
1977
 
1987

 
(mil) 
 (%)
       (mil) 
  (%)
       (mil) 
   (%)
População
7 097 
 
10 273 
 
16304 
 
Taxa de motorização
 
7.0
 
13.5
 
14.5
Coletivo
4 894
 68.1
 9 759
 61.0
   10 335
   55.9
Individual
  2 293
 31.9
     6 240
  39.0
     8 141
   44.1
Total rodas
  7 187
    -
  15 999
   74.8
  18 476
   63.6
Mobilidade (v/cap)*
   1.01 
 
    1.56 
 
   1.13 
 
A pé
n.d. 
-
5400 
    25.2
    10591 
  36.4
TOTAL
-
 100.0
21399
100.0
29067 
100.0
(*) Número de viagens motorizadas diárias per capita.
Fonte: Pesquisa OD/87, RMSP

Tais movimentos no padrão das viagens devem-se essencialmente à política econômica nacional e a seus efeitos sobre a renda da população, fator que mais determina a sua mobilidade, como se verá adiante. Ao se desagregar os transportes coletivos segundo os modos trem/Metrô/ônibus, observa-se outro movimento, este, devido à política de transporte pròpriamente dita. A produção de viagens coletivas per cápita teve queda considerável (a diferença sendo absorvida pelas viagens a pé) mantendo-se pràticamente o volume total de viagens inalterado de 1977 a 1987. No entanto, a implantação da maior parte da 'rede' de Metrô hoje existente na segunda das duas décadas, ainda que de comprimento reduzido, teve o importante efeito de neutralizar inteiramente o efeito potencial da extensão física da aglomeração urbana sobre a duração das viagens por transporte coletivo, através da absorção de quase 1,5 milhões de viagens diárias ou, em conjunto com o trem, 12% das viagens coletivas (contra 6,6% em 1977). Assim, o tempo médio de percurso das viagens coletivas manteve-se em torno de uma hora (59 min em 1987 contra 57 min em 1977). Tabela 2

REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO
EVOLUÇÃO DA DIVISÃO MODAL: 1977 e 1987
Segundo modo principal, motorizado
 
 
 1977
 
1987
 
Modo principal
(mil) 
(%)
(mil) 
(%)
Metrô
542 
3.4
1 438 
7.6
Trem
498 
3.2
827 
4.4
Ónibus
8 545 
54.2
8 050 
42.8
Auto*
5 453 
34.6
8 028 
42.7
Outros
720 
4.6
473 
2.5
Total
15 758 
100.0
18 816 
100.0
(*) Inclui táxi e lotação.
Fonte: Pesquisa OD87, RMSP

Vale lembrar que se a rede de Metrô de São Paulo é extremamente reduzida quando comparada com qualquer outra metrópole do mundo, inclusive da América Latina como a Cidade do México (Figura 1), ela é também altamente 'eficiente' estando em primeiro lugar, com Moscou e Tóquio seguindo de perto, em número de passageiros transportados por quilômetro de linha (cf. tabela abaixo). Tal índice, por sua vez, é produto de três fatores, dos quais apenas o primeiro é atestado de eficiência pròpriamente dita, a saber, a frequência das composições nas linhas, inferior a 2 min de intervalo, muito próximo do máximo técnicamente viável. Já o segundo, a taxa de ocupação dos vagões a 6,5 pessoas/m2 na hora-pico, e o terceiro, das linhas operarem à capacidade de saturação em quase toda sua extensão, são indicativos mais do nível de serviço e da Tabela 3

REDES DE METRô, 1988
Aglomerações urbanas selecionadas

População
Área
Início
Extensão Passag. Pass/km Lin/cáp.
Cidade
(milhões)
(km2)
(Ano)
(km)
(M/dia)
(mil/dia)
(km)
São Paulo
16,0
7900
1967
42
1,5
35,71
2,6
Mexico
17,5
7860
1967
141
4,0
28,37
8,1
Toquio
11,6
21400
1927
197
6,8
34,52
17,0
Moscou*
12,5
5900
1936
217
7,0
32,26
17,4
NewYork
19,0
8000
1868
416
3,1
7,45
21,9
London
6,7
1600
1863
398
2,1
5,28
59,4
(*) 1985.
Fonte: Dados compilados por Klára K Mori,1989, mimeo.


 
Figura 1: Redes de Metrô em cidades selecionadas.- Comparação de algumas metrópoles do mundo quanto à extensão de suas redes de Metrô em termos absolutos (em azul) e relativos a sua população (km/milhão, em vermelho). O nível de atendimento (km de rede per cápita) em São Paulo é de ordens de grandeza inferior até do que nas demais cidades Latino-Americanas.Fonte: Mori (1989).

demanda reprimida que de eficiência. O melhor indicador do nível de atendimento talvez seja o número de km de linha por habitante, em que São Paulo detém o contra-recorde absoluto atrás até de Beijing, sendo que a China tem uma renda per cápita perto de um décimo da renda per cápita brasileira.
 
 

3 Mobilidade da população segundo sua renda

Produção de viagens segundo a renda familiar

A divisão modal segundo os grandes modos: coletivo, individual e a pé, segundo a renda familiar, reflete naturalmente o fato refletido também pela produção de viagens, a saber, a concentração das viagens coletivas nas faixas de renda baixa --na verdade, não há 'produção de viagens' sem uma 'divisão modal' associada. Assim, a divisão modal, com forte predominância do modo coletivo nas faixas de renda baixa (mais de 80% na renda até 4sm) inverte-se a favor do automóvel a partir de 15sm, cuja participação chega a quase 80% das viagens da população de renda acima de 30sm.

Quanto às viagens a pé, sua participação cai de mais da metade do total das viagens (55%) para pessoas das famílias de renda até 4sm para um sétimo (15%) nas rendas superiores a 30sm.

A renda familiar é a mais forte determinante --em conjunto, como é natural, com a idade do indivíduo-- da mobilidade. Os indivíduos da faixa de renda familiar mais alta viajam quase quatro vezes mais que da faixa mais baixa, a relação sendo 3,83. A Figura 2 e a Tabela 4, abaixo, ilustram o padrão de mobilidade da população segundo sua renda.
 

 
Figura 2: Produção de viagens segundo a renda.- Número de viagens produzidas segundo 5 faixas de renda familiar e os três grandes modos: coletivo (transporte público), individual (automóvel) e a pé, em volumes totais da Região Metropolitana (em cima) e per cápita (em baixo). A produção de viagens motorizadas por pessoa na faixa de renda acima de 30 salários mínimos é quase 4 vezes a mobilidade na faixa de renda até 4 SM; por outro lado, nessa última faixa, mais da metade das viagens são realizadas a pé, enquanto 2/3 das viagens na faixa de renda superior são feitas de carro.

 

Tabela 4

MOBILIDADE: PRODUCÃO DE VIAGENS (per capita)
Segundo modo principal e faixa de renda (SM)
Mobilidade e viagens por faixa de renda
 
MODO PRINCIPAL
Até4
4-8
8-15
15-30
>30
TOTAL
Coletivo
0.47
0.64
0.76
0.72
0.51
0.63
Individual
0.10
0.20
0.47
0.90
1.74
0.50
Total motorizadas
0.57
0.84
1.22
1.62
2.25
1.14
Viagens motorizadas(milhares)
1921
3834
5189
4567
2903
18525
A pé*
0.69
0.77
0.70
0.58
0.39
0.67

População (milhares) 3378 4577 4247 2812 1290 16304
População (%) 20.7 28.1 26.0 17.2 7.9 100.0
* Incl. Outros= bicicleta, caminhão etc.
Fonte: Pesquisa OD87


A produção das viagens segundo a renda da população se diferencia mais ainda quando se leva em conta também a divisão modal, ou seja, o modo de transporte utilizado. Assim, a produção de viagens coletivas, vale dizer, a utilização do transporte público, começa aumentando segundo a renda até as faixas de renda médias (de 0,47 a 0,76 v/cap) para daí cair de novo para as rendas mais altas (0,51 v/cap). O efeito combinado da renda e da divisão modal faz com que 79,16% das viagens por transporte coletivo são realizados por pessoas que pertencem a famílias de renda entre 4 e 15 salários mínimos. Já no caso do transporte individual (que aqui engloba automóvel, táxi, lotação e motocicleta) pelo contrário, o efeito da renda sobre a produção das viagens é mais pronunciado que para o total motorizado. Com efeito, a produção de viagens de automóvel se eleva de 0,1 v/cap para a faixa de renda inferior (até 4sm) para 1,74 v/cap para a faixa de renda superior (acima de 30sm), ou seja: a mobilidade por transporte individual é nada menos que 17 vezes mais alta na faixa de renda superior que na faixa inferior.

Padrão de mobilidade segundo a faixa de renda

À parte o volume de passageiros transportados, o nível de serviço oferecido por determinado sistema de transportes reflete-se em particular nos tempos de percurso, ou duração das viagens, outra característica passível de ser objeto de uma política de transportes. A Tabela 5 abaixo reproduz a situação em 1987, através das distribuições das viagens segundo sua duração para as 5 faixas de renda familiar, no caso dos transportes coletivos.

Tabela 5:

RMSP: DURAÇÃO DAS VIAGENS, 1987
Modos coletivo, segundo 5 faixas de renda

Duração F A I X A    D E    R E N D A ( S M )
acima de Até 4  4-8 8-15 15-30 > 30
(min) Proporção sobre o total da faixa (%)
15 98.3 97.8 96.0 95.9 94.7
30 85.6 83.9 78.0 76.0 70.2
45 67.0 65.0 57.8 53.9 46.0
60 49.6 47.8 41.1 36.7 29.0
75 35.6 34.3 28.8 24.6 18.1
90 25.0 24.0 19.8 16.2 11.3

Total (mil) 1414 2609 2858 1803 583
Tempo médio(min) 48 57 59 65 65

Fonte: Pesquisa OD87

Como era de se esperar, a renda é novamente um fator fortemente diferenciador, com o aumento da proporção das viagens longas conforme diminui a renda familiar. Se a proporção das viagens longas (acima de 60min) é de menos de um terço (29%) das viagens realizadas pela população de renda alta, a mesma proporção se eleva para a metade (50%) das viagens para a população de renda mais baixa, para a qual também um quarto das viagens são muito longas -acima de 90min-- que significa mais de três horas de viagem diárias, com pelo menos uma viagem de ida e outra de volta. O gráfico da Figura 3, abaixo, representa, de uma maneira mais geral, as curvas de distribuição das viagens segundo sua duração, onde se observa nìtidamente uma 'família' de curvas que vai de um extremo, bastante concentrada na região de viagens razoàvelmente curtas (média modal 25min) para indivíduos pertencentes a famílias de renda acima de 30 sm, a outro extremo para a faixa de renda mais baixa, de até 4sm, com uma dispersão das frequências em direção das viagens mais longas e correspondente aumento da média modal para mais de 40 min.

Figura 3: Duração das viages por transporte coletivo.- A distribuição de frequência das viagens segundo sua duração segue uma distribuição log-normal, com vértice na média modal (duração mais frequente, ou típica). Aqui, uma família de curvas representa tal distribuição para as viagens coletivas (Metrô/ ônibus), segundo as cinco faixas de renda familiar, que se concentram nas viagens mais curtas para a renda mais alta, para se distribuirem mais nas viagens mais longas conforme diminui a renda. 4 Parâmetros da demanda de viagens, 2000

Crescimento da população e da renda
Crescimento da população

Com a queda da taxa de crescimento da população da RMSP, esta última deve chegar à ordem de 23,1 milhões de habitantes -nas estimativas que seguem, foi adotada essa projeção razoavelmente consolidada em vários órgãos de planejamento- para 2000.

Renda e distribuição de renda

O segundo fator determinante, como visto, da demanda de viagens, ou seja, por transporte, é a renda e a distribuição da renda da população. Sua estimativa -tanto da renda como de sua distribuição- é sujeita a controvérsia, dado que depende da condução futura da política econômica brasileira, sobre a qual pesa uma vasta gama de expectativas e projetos, inclusive conflitantes. A estimativa aqui apresentada segue uma das hipóteses, ou perspectivas plausíveis, a saber, aquela balizada pelas definições resultantes da Constituição de 1988, que preconiza a duplicação do salário mínimo no primeiro ano para a seguir elevá-lo à taxa de 5% ao ano, o que equivale à triplicação de seu valor num período de dez anos. Os salários (aqui expressos em termos de renda familiar), acima do mínimo cresceriam também balizado por aqueles, mas em propoções decrescentes segundo aumenta seu nível (Figura 4a). A projeção pressupõe ainda --já implicada na elevação preconizada do salário mínimo-- uma elevação da renda per cápita em torno de 4% ao ano, o que equivale, com um crescimento demográfico da ordem de 2%, a uma expansão do produto nacional a 6% anuais. Vale lembrar que tal taxa corresponde bàsicamente à retomada da taxa de crescimento histórico interrompido pela recessão da década de 1980 devido ao impasse, de ordem social, gerado pela eventualidade do Brasil esgotar um determinado estágio (extensivo) de desenvolvimento e passar para outro estágio (intensivo), este, baseado no progresso técnico (com aumento da produtividade do trabalho, elevação dos salários e alargamento do mercado) e não mais predominantente em extensão do trabalho assalariado. A esse título, portanto, a hipótese elaborada pressupõe também o desempate (adiado pelo imobilismo do período Sarney e recolocado em questão pela política expressa nas reformas econômicas do governo Collor) das forças que mantinham o impasse dos anos 80,

Figura 4: Hipótese de re-distribuição de renda, 2000.- A triplicação do salário-mínimo (ou um aumento de 200%) até 2000 e aumentos em escala decrescente conforme aumenta a faixa de renda, até um mínimo de 57% (ou 3% ao ano) nas rendas mais altas, corresponde à re-distribuição de 1% da renda total, com o crescimento da renda per cápita à taxa de 4 % ao ano (à esquerda). O resultado é um pequeno porém apreciável deslocamento da curva de distribuição da renda familiar mensal da população paulistana à direita, com uma diminuição dos contingentes abaixo de 4 SM e correspondente aumento do contingente de população com renda entre 4 e 12 SM (à direita). assim como as correspondentes transformações sociais e da estrutura de produção. No que toca à aglomeração urbana em particular, uma implicação importante na transição ao estágio intensivo é a necessidade da elevação considerável dos níveis de infraestrutura urbana para permitir a concretização dos ganhos de produtividade gerados no âmbito da produção de mercadorias. Tal necessidade é especialmente relevante para uma política de transportes, uma vez que a acessibilidade e a homogeneização do espaço constituem uma característica essencial da aglomeração urbana, por serem um pré-requisito a todas as demais funções urbanas, seja de produção seja de reprodução.

A projeção da renda da população, em função da previsão do crescimento econômico e demográfico segundo as hipóteses acima enunciadas resulta em uma elevação da renda média das 5 faixas de renda --expressas em salários-mínimo de setembro 1987-- como resumido na Tabela 6 abaixo. Por sua vez, a distribuição de renda é ilustrada na Figu-
 
 

Tabela 6:
REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO
ESTIMATIVA DA RENDA E DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, 2000
Renda familiar mensal
-----------------------------------------------------------------------------------------------

População Renda da
faixa (SM)
Faixa  (%) 1987 2000
Até 4 20.7 2.34 4.63
  4-  8 28.1 5.86 9.63
  8-15 26.0 10.96 16.56
15-30 17.2 20.80 29.82
    >30   7.9 49.97 68.34
Total (mil)
16 304 23 106
R méd (SM)
12.5 18.5


Obs: SM= Cz$2062 de setembro de 1987 (~US$ 41.-).

CsD, 1989.

ra 4b (acima), que representa as distribuições no ano-base e ano-meta da projeção, ou 1990 e 2000, respectivamente. Ali se observa um ligeiro deslocamento da curva de distribuição para a direita, no sentido das rendas mais altas. Para se ter uma idéia da quantidade de renda re-distribuída como efeito das hipóteses acima, vale observar que esse volume corresponde a 1% da renda total, as rendas mais altas crescendo a 3% ao ano, contra os 4% da renda média. Que mesmo uma distribuição de uma parcela tão pequena da renda resulte em uma triplicação das rendas menores, deve-se ao elevado grau de concentração atual da renda.

Demanda de transportes: mobilidade e divisão modal

A hipótese de evolução da renda da população para o ano-meta permite estimar as mobilidades da mesma população por faixas de renda, com base na análise da correlação entre a mobilidade e da renda em 1987, como resumida mais acima. Na Figura 5 ao lado, são representadas as mobilidades da população da Região Metropolitana de São Paulo por modos coletivo e individual, em função de sua renda, e os respectivos estimadores. Tais estimadores, com as rendas em 2000 da Tabela anterior, fornecem as mobilidades individuais no mesmo ano, constantes da Tabela 7.

Tabela 7:
REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO, 2000

MOBILIDADE POR MODO, 1987 e 2000 (Est.)

Faixa de renda FR/Tot
Coletivo Individual
(SM) (%) 1987 2000 1987 2000
Até 4 20.7 0.47 0.594 0.10 0.206
  4- 8 28.1 0.64 0.739 0.20 0.352
  8-15 26.0 0.76 0.755 0.47 0.662
15-30 17.2 0.72 0.606 0.90 1.423
    >30 7.9 0.51 0.387 1.74 1.952
Total 100.0 0.64 0.66 0.49 0.71

CsD,1989.

Finalmente, as estimativas de demanda total de transporte na Região Metropolitana, pelos modos coletivo (Metrô/ ônibus) e individual (automóvel) estão resumidas na Tabela 8 abaixo, onde constam também os respectivos dados para 1987, para efeito de comparação. Observe-se, além do aumento significativo da demanda em transpor-te coletivo devido ao simples crescimento demográfico, a duplicação da demanda de viagens de automóvel que se deve, adicionalmente ao crescimento demográfico, ao crescimento e
 

  Figura 5: Produção de viagens, coletivo e individual.- Os estimadores de produção de viagens em função da renda foram ajustados com base na produção de viagens por cada modo em 1987. As viagens coletivas per cápita são descritas por uma curva com máximo na região de 12 SM (0,8 viagens diárias) e com asíntota horizontal (0,25) para as rendas altas, enquanto que as viagens de automóvel são representadas por uma logística de assíntota pouco acima de 2 viagens diárias por pessoa. Tais funções permitem estimar a demanda de viagens, por modo coletivo e individual, em função dos movimentos de renda previstos na hipótese de projeção e distribuição da renda para 2000. Os totais resultantes para cada modo para a Região Metropolitana constam na Tabela 8 abaixo. distribuição da renda, resultando em um aumento de 8 para 16 milhões de viagens diárias.
 
  Tabela 8:
REGIÄO METROPOLITANA DE SÄO PAULO
VOLUME DE VIAGENS POR MODO, 1987 e 2000(Est.)*
Segundo faixas de renda familiar
-----------------------------------------------------------------
Viagens motorizadas Coletivo      Individual

Renda 2000/87 2000/87 2000/87
(SM) 1987 2000 (%) 1987 2000 (%) 1987 2000 (%)
-----------------------------------------------------------------
Até 4 1912 3832 100.2 1570 2845 81.2% 337 986 192.1
< 8 3822 7072 85.0 2898 4791 65.3% 916 2280 149.1
8 < 15 5194 8533 64.3 3192 4546 42.4% 1997 3986 99.7
15 < 30 4528 8085 78.5 2002 2414 20.6% 2532 5671 124.1
30 < 2885 4276 48.2 650 707 8.8% 2246 3569 59.0
-------------------------------------------------------------------
TOTAL 18343 31799 73.4 10315 15305 48.4% 8028 16494 105.5
População 16304 23106
--------------------------------------------------------------------
(*) Em milhares. Exclui a categoria 'Outros'.
CsD, 90
 
 
 
 

Vale lembrar a esse respeito desde já, que por um lado, o atendimento de um tal crescimento da demanda de viagens de automóvel é virtualmente impossível, além de indesejável; e por outro lado, que a principal, senão a única alternativa às viagens individuais é o Metrô. Assim, a título de exemplo inicial, para apenas manter a divisão modal atual entre coletivo e individual, ou seja, assegurar 56% das viagens motorizadas por transporte coletivo (ou 17,9 milhões diárias), o Metrô teria de absorver da ordem de 2.6 milhões de viagens (quase o dobro de sua capacidade total atual) adicionais a seu crescimento segundo a tendência histórica. No entanto, se a demanda de transporte pode ser estimada simplesmente a partir de tendências, o atendimento da demanda só pode ser planejado mediante o estabelecimento de intenções e projetos, e que ademais devem levar em conta os diversos sistemas (modos) de transporte em seu conjunto. Tais definições compõem uma política de transportes, como aquela esboçada a seguir.
 

5 Uma política de transporte rápido de massa: Metrô

Uma política de transportes deve contemplar naturalmente todos os modos de transporte --e nem sòmente todos os públicos--, uma vez que o desempenho de qualquer um deles depende do desempenho de todos os demais. Vale dizer, a escolha de um modo de transporte por qualquer usuário depende, além do nível de serviço e do custo de dado sistema particular, das mesmas características de performance e custo dos demais modos que são as alternativas do primeiro. Sem deixar de levar este fato em conta, concentramo-nos no que segue no transporte rápido de massas --essencialmente: Metrô--, por ser aquele que estrutura em última instância, os demais sistemas de transporte.

Dimensionamento e ritmo de implantação

Uma primeira implicação imediata --já assinalada-- das estimativas de demanda de viagens por modo da Tabela 8 (acima), é que segundo a 'tendência espontânea', a divisão modal coletivo/individual cairia para apenas 48% (isto é, 48% das viagens sendo realizadsas por transporte público), devido ao aumento explosivo, no caso, duplicação, das viagens por automóvel. Claro está que que tal volume, 16,5 milhões de viagens diárias, corresponde a uma pesada demanda em estrutura viária, sem o provimento da qual o mesmo não pode se realizar, e no caso de tal estrutura viária ser construída --uma tarefa dispendiosa e de difícil execução até física-- levaria a níveis de congestionamento, de poluição e de demanda em serviços auxiliares hoje inimagináveis --basta lembrar que em dias de chuva o número de carros na rua não aumenta em mais que 5 a 10 por cento. No que segue, preconizamos uma meta --modesta-- da redução da queda da divisão modal, dos atuais 56,5% 'apenas' para 52% de viagens coletivas (ao invés dos 48% da tendência), reduzindo assim o aumento de viagens individuais em pouco mais de um milhão (para 'somente' 15 milhões de viagens diárias, ainda uma quase-duplicação sobre os atuais 8 milhões). Essa diferença deverá ser absorvida por transporte coletivo, cujo volume assim deve chegar a 16,5 milhões (cf. Tabela 9, abaixo) contra 10,3 milhões atuais.

Como já mencionado, tal excesso de demanda por transporte individual teria de ser absorvido pelo transporte rápido de massas. No entanto, este sistemas deverá absorber mais que isso: absorver também uma boa parte da demanda sobre o próprio transporte coletivo. Segundo a meta de 52% das viagens serem realizadas por transporte público, há uma demanda - adicional no período 1987/2000 - sobre esse sistema de mais de 6 milhões (6,221m) de viagens, que evidentemente não podem ser absorvidos exclusivamente pelo ônibus, cuja capacidade teria de saltar dos atuais 8 milhões de viagens para 14,3m, um aumento de 78%, quando na década 1977-87 essa capacidade se

Tabela 9:

REGIÄO METROPOLITANA DE SÄO PAULO
ESTMATIVA DA DEMANDA DE TRANSPORTES POR MODO, 2000
(milhares)*ACRESCIMO
-----------------------------------------------------------------------
1987       Dem'Esp'2000 Meta   Dem Colet/

MODO TRANSP Volume DivMod Volume DivMod Div Mod   Volume -Capac Onibus/
(Abs) (%) (Abs) (%) (%)    (Abs) Dem Metrô
-----------------------------------------------------------------------
Viagens (TOTal) 18 343 31 800
Individual 8 028 43.8 16 494 51.9 48.0  15 264 7 236
Coletivo 8 025 56.2 15 305 48.1 52.0  16 536 6 221

Onibus 8 050 (Delta=) 20%=>  -1 610
Delta Metrô 1 230 4 611
-----------------------------------------------------------------------
Metrô: Demanda nova 4 611
Pass/km (mil, 1977) 34.2 =
------------------------ Extensão 135 km
(*) Exclui a categoria 'Outros'. Implantação: [-10km] 12.5 km/ano
CsD,90
 
 

mantinha estacionária (Tabela 2, acima, ou também Tabela 10 abaixo). Admitindo um crescimento máximo de 20% da capacidade do sistema ônibus (1,610m), o Metrô fica com a demanda adicional de mais de 4,5 milhões (4,611 m) de viagens diárias para absorver.

Em termos de extensão da rede, a absorção dessa demanda requer, a se admitir as presentes taxas de utilização das linhas -que transportam 34,2 mil passageiros por quilômetro de rede- a construção de 135km de linhas no período 1987/2000, ou (levando-se em conta em torno de 10km construídos nos últimos três anos) da ordem de 125km ou 12,5km por ano no período 1991/2000. É preciso imaginar a cidade em obras, por um período considerável por vir...

A Tabela 10, abaixo, resume os resultados dessa política, em termos de volumes e divisão por modos de transporte das viagens em 2000, e onde constam também os mesmos valores para 1977 e 1987 para permitir uma visão sobre sua evolução a longo prazo. Observe-se que mesmo com a construção de 125km de rede de

Tabela 10: EVOLUÇÃO DA DIVISÃO MODAL: 1977, 1987 e 2000 (Est)
Segundo modo principal, motorizado
(milhares)
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------
1977       1987       2000
Modo (Estimado)

principal (/mil) (%)  (/mil)  (%)  (/mil)  (%)
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------
Metrô 542  3.6  1438  7.8  6049  19.0
Trem 498  3.3  827  4.5  827  2.6
Onibus 8545  56.8  8050  43.9  9660  30.4

(COLETIVO) (9585) (63,7) (10315) (56,2) (16536) (52,0)

Auto 5453  36.3  8028  43.8  15264  48.0
Outros*720  [ 4.6] 473  [ 2.5] 500  [ 1.5]
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------
Total 15758  100.0  18816  100.0  32300  100.0
Mobilidade(v/cap) 1.52  1.15  1.40
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
(*) Excluído da divisão modal.
CsD, 1990

Metrô, há ainda a demanda de quase 10 milhões de viagens exclusivamente de ônibus (além das viagens de 'integração', em torno de 3M), representando um aumento de 20% da capacidade desse sistema, e que ainda assim, há a demanda por mais de 15 milhões de viagens de automóvel, um aumento de 90 %, ou virtual duplicação do volume atual. De maneira que, se por um lado, a meta da construção de 125km de Metrô em 10 anos pode parecer ambiciosa, ela na verdade é bastante tímida e deixa outras tarefas aos demais sistemas (**exemplo?) de solução ainda mais difícil. Tal situação é fruto dos atuais níveis agudos de escassez resultantes da ausência de *investimentos na infraestrutura urbana a níveis sequer aproximadamente compatíveis com o crescimento urbano, particularmente durante a década de 80, pelas razões já aludidas. A consequência de omissão continuada nessa área seria um virtual colapso das funções de circulação, algo semelhante ao ocorrido nos meados dos anos 1960 -- a uma escala quatro vezes maior.

Finalmente, a Tabela 10 mostra também que a implantação da política aqui preconizada não representa, na verdade, nenhuma ruptura com algumas das tendências que hoje já estão em curso, até pelo contrário. Assim, em particular, cai a participação do transporte público no total das viagens, ainda que numa proporção algo menor que na década anterior. Por outro lado, ao interior do transporte público, os sistema sobre trilhos (Metrô/trem) aumenta sua participação, de 12% para 22%, uma quase-duplicação, à semelhança da década anterior. Tais ordens de grandeza, envolvidas numa política de transportes, talvez
 
 

Figura 6: Uma rede básica de Metrô, 2000.- A construção da ordem de 125 km de linhas de Metrô até 2000 (vide texto) segundo a diretriz de uma Rede Básica como aquela aqui representada rompe barreiras seculares que secionam a aglomeração metropolitana, resulta em uma rede que transporta 6 milhões de passageiros por dia e reduz o tempo gasto diáriamente em viagens por transporte público --Metrô/ônibus-- em cerca de meia hora por pessoa, compatível com um ganho de produtividade do trabalho na Região Metropolitana de São Paulo da ordem de 6,3%. As prioridades dos diversos trechos estão ilustradas pelas etapas de implantação da rede para os anos de 1990 (ano-base), 93, 95, 98, 2000 e 2003 (em baixo).

mostrem que, se por um lado, não parece plausível elevar a meta de construção do Metrô aqui preconizada para a década considerada, por outro lado, mesmo na hipótese favorável de adoção de uma política agressiva jà, ainda restará a tarefa de se colocar o transporte público em dia para a década subsequente.
 

Custo e benefício

O custo de implantação do sistema Metrô é da ordem de US$80 milhão por quilômetro de linha. Assim 12,5 km por ano representam um investimento da ordem de US$1 bilhão por ano, ou 0,25% do Produto Nacional por ano, ou ainda, 2,5% no total do período. Entre os benefícios consideremos apenas a redução dos tempos de viagem --além de benefícios mais 'intangíveis' como economia de combustível, redução da poluição atmosférica ou os efeitos sobre a indústria e o desenvolvimento tecnológico-- para uma idéia de ordem de grandeza. A redução dos tempos médios de percurso das viagens coletivas de apenas 15min --um valor sèriamente subestimado, em toda probabilidade-- representa um ganho de meia hora por dia por trabalhador da Região Metropolitana de São Paulo, ou 6,3% da jornada de trabalho. Um aumento de produtividade de 6,3%, portanto, para a RMSP que produz um quarto do Produto Nacional, equivalendo assim a um ganho de 1,6% do PIB. Em termos de custo/benefício, contando apenas o ganho em tempo gasto em viagens, e estimando-se a vida útil do equipamento em 40 anos, o aumento da taxa de crescimento anual médio da economia durante todo o período (de construção e de vida útil) é da ordem de 1,34%, acumulando ganhos na produção da ordem de 66,8% do PIB, ou benefícios excedendo ou custo (2,5% do PIB) em cerca 2670 por cento, ou 27 vezes (vide também Figura 7).

Entre os benefícios não-quantificados vale destacar a redução dos diferenciais de preço do solo da aglomeração urbana, isto é, redução dos preços relativos das localizações mais privilegiadas ('preço do solo urbano'), devido ao efeito de homogeneização da acessibilidade na região metropolitana como um todo. Trata-se aqui, na verdade, do instrumento mais efetivo --senão a único-- de combate à especulação imobiliária descontrolada, frequentemente enunciado e visto como um dos grandes objetivos do planejamento urbano.
 

Elemento estruturador da aglomeração metropolitana

Uma extensão de 125km de rede a construir significa da ordem de 4 novas linhas extensas como aquelas da rede exemplicada no mapa ao lado. O traçado alí preconizado procura utilizar ao máximo o potencial do sistema de transporte rápido de massas em quebrar o isolamento de regiões inteiras, vencer barreiras físicas há muito intransponíveis e de maneira geral, romper a segregação espacial da estrutura da aglomeração metropolitana a que se referiu no início deste trabalho.

Figura 7: Retorno do investimento na expansão do Metrô.- O desvio de uma parte da força de trabalho de uma sociedade para a construção de uma infraestrutura, que permitirá elevar a produtividade do trabalho, resulta sempre em uma queda inicial e subsequente aumento da taxa de acumulação (em cima). As magnitudes e prazos envolvidos dependem do peso do investimento, dos ganhos de produtividade dele decorrentes e da taxa de acumulação corrente. O caso concreto do Metrô de São Paulo corrresponde ao efeito do investimento de US$10 bilhões em 125 km de novas linhas sobre o crescimento econômico (em baixo). As perdas iniciais no crescimento do restante da produção, devidas ã concentração de recursos na construção e distribuídos por um período de 10 anos (0,25% do PIB anualmente) são quase imperceptíveis e são compensadas pelos ganhos de produtividade do trabalho (0,16% anuais durante o período de construção, com uma defasagem de um ano) já no quarto ano após o início de implantação. Para uma vida útil do equipamento de 40 anos, o ganho na taxa média de crescimento anual durante aquele período é da ordem de 1,35%, acumulando um ganho equivalente a 60% do PIB, para os 2,5% investidos.
 

A prioridade zero --a mais premente-- é provàvelmente o prolongamento da Linha Paulista em direção a Nordeste, até São Miguel. Este tramo desafoga imediatamente a Linha Leste há muito super-saturada, assim como o tramo Sul da Linha Norte-Sul. Constitue, na verdade, no primeiro passo para a constituição de uma rede propriamente dita, formando uma malha com cruzamentos entre as linhas na Sé, Paraíso e Artur Alvim. Uma sequência de etapas de implantação é ilustrada na Figura 6, em baixo.

Uma característica importante da rede básica é a transposição das barreiras formadas pelos rios e vales em vários pontos (observe-se por exemplo o Arco Norte), a busca de alguns equipamentos de grande porte (Aeroporto, Cidade Universitária etc.), a adensamento da rede no centro, mas com linhas que sempre demandam diretamente a periferia, minimizando as transferências durante as viagens.

Uma rede assim configurada constitui uma primeira etapa do transporte rápido de massa, em que este conquista efetivamente a escala metropolitana, abarcando e estruturando toda a aglomeração urbana. Etapas subsequentes deverão cuidar de seu adensamento e aprimoramento.


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