..2002.4.9
.Política econômica
Retranca ou gol contra?
o
Folha de S Paulo, 02.4.9:B-2


OPINIÃO ECONÔMICA 
Xô, candidato retranqueiro! 
BENJAMIN STEINBRUCH

Especula-se constantemente sobre quem seria o candidato dos empresários à Presidência da República. José Serra é muito citado, mas aparecem também Ciro Gomes, Garotinho, Roseana e até Lula ou alguns que já estão fora do páreo, como o governador do Ceará, Tasso Jereissati.

A idéia de rotular candidatos como representantes de categorias ou classes sociais é equivocada. Para quem vive no mundo dos negócios, aceitar isso seria concordar com a visão preconceituosa de que empresários têm interesses conflitantes com os da sociedade em geral. Além disso, não há um pensamento homogêneo no setor empresarial e em nenhuma outra categoria. Diferentes são as proposições de industriais, banqueiros e agricultores, assim como há posições divergentes entre trabalhadores. Mesmo dentro dos setores empresariais existe diversidade entre as aspirações do capital nacional e do capital estrangeiro.

Mais correto seria falar em candidato da produção e do emprego. A necessidade de produzir mais e criar postos de trabalho é uma das raras unanimidades do atual momento brasileiro. Assim, qualquer um que defenda isso merece apoio de todas as classes sociais e categorias. Empresários e trabalhadores querem um novo presidente que recupere a gana de crescimento que o Brasil já teve no passado, porque não há outro caminho para o país.

O governo Fernando Henrique Cardoso, muito bem-sucedido em seu plano de estabilização, foi uma decepção em matéria de desenvolvimento. FHC vai chegar ao fim de seu mandato de oito anos com crescimento médio de 2% ao ano no Produto Interno Bruto, taxa inferior à expansão média da economia mundial no período. Claro que foram tempos difíceis, cheios de crises externas, mas faltou à atual administração aquela disposição obsessiva de promover o desenvolvimento, sem o que nenhum país pobre consegue avançar. FHC jogou na retranca a maior parte de seu tempo no poder e quando tentou ir ao ataque já era tarde demais para mudar o jogo.

A retranca fez com que a empresa nacional enfrentasse nos últimos anos uma verdadeira concorrência desleal com o capital estrangeiro dentro do próprio país. Enquanto as companhias nacionais sofriam com deficiência de capital, sem crédito de longo prazo e se afogavam em juros exorbitantes, as estrangeiras se abasteciam de capital barato em suas fontes internacionais.

A retranca impediu que seguisse adiante uma verdadeira reforma tributária para desonerar o setor produtivo e as exportações, o que tornaria a produção nacional mais competitiva no exterior.

A retranca deixou desamparados setores industriais que já são internacionalmente competitivos e que poderiam ter sido estimulados a dar colaboração muito maior na obtenção de divisas para o país.

A retranca permitiu a venda ao capital estrangeiro de setores estratégicos de infra-estrutura e escancarou o mercado interno sem nenhuma reciprocidade dos parceiros comerciais beneficiados por essa atitude.

Os candidatos a presidente, portanto, terão de provar que estão dispostos a abandonar a tática defensiva e partir para o ataque. O candidato dos empresários, assim como dos trabalhadores e da população em geral, será aquele que mais se afastar do perfil de retranqueiro, que aliás é repelido pelo temperamento brasileiro tanto no futebol como na política.

O Brasil está muito atrasado na elaboração de um projeto para atacar seus verdadeiros problemas. E isso interessa a todos os brasileiros, independentemente de categoria ou de classe social.


Benjamin Steinbruch, 47, empresário, é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
 
 
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Não dito

 
Questão
A passagem assinalada em vermelho acima é um resumo razoável da política FHC, mas:

Vender as firmas, particulares e estatais, ao capital estrangeiro foi um 'êrro tático'?

...Acompanhado de uma política de desfavorecimento das empresas nacionais, expondo-as a 'concorrência desleal'?
Ver também "Protecionismo às avessas"

A todos os brasileiros interessa a mesma coisa? O 'bem comum' das sociedades burgueses tem base concreta na sociedade de elite?

Um presidente pode ser muito bem sucedido em estabilização e decepção em desenvolvimento? (Na afirmativa, o que vale o 'sucesso na estabilização'?)


 
Contraponto
Uma política econômica é ou de desenvolvimento ou de manutenção do status quo. Analisar aspectos setoriais e pormenores em separado leva a se perder em 'complexidades'.

Leitura adicional
Acumulação entravada


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